A ossada

Peça axial com as suas peças constitutivas: Quilha, roda de proa e cadaste. As goivas serviram para abrir o alefriz na roda que serve para acondicionar o topo das voltas do forro. Não se fez o alefriz na quilha, pois o modelo não é navegante e a tábua do resbordo pode ladear a quilha sem se encaixar, parcialmente, no interior da mesma, de modo a garantir a estanquicidade da construção.
A roda de proa assenta, a topo, sobre a face superior da quilha onde foi previsto um entalhe para permitir que a roda possa ser cavilhada a partir da face inferior da quilha e da parte dianteira da roda. Dois madeiros reforçam a união entre a roda e a quilha; são os corais da roda.
Tal como a roda, também o cadaste assenta a topo sobre a quilha. Os corais reforçam a estrutura na ré e dão passagem à cachola do leme.
Sem prejuízo de poder reproduzir, na íntegra, o projecto construtivo de acordo com a sequência normal da cadeia produtiva, muitas vezes é necessário adaptar as técnicas de modelação para garantir essencialmente a eficácia dos resultados. O modelo foi construído com a quilha a fazer de portaló e as balizas foram colocadas no lugar, antes de aplicar a quilha. Esta solução não é utilizada num projecto de construção à escala real, já que o primeiro elemento a ser colocado no estaleiro é a quilha com as suas ramificações externas, que são a roda de proa e o cadaste. Para efeitos de registo documental, simula-se agora um procedimento mais realista de construção, arvorando a baliza mestra sobre a quilha.
Com o casco desempolado exteriormente, aplica-se agora a estrutura axial. O barco continua preso ao estaleiro para impedir qualquer desvio acidental da estrutura.
As armadouras desempenham um papel determinante na dinâmica construtiva. A historiografia tende a separar do ponto de vista funcional as armadouras ditas do “traçado”, que servem de indicadores para a definição do formato e de apoio ao assentamento das balizas, das “armadouras de construção”, que fixam as balizas no lugar e dão apoio às escoras que seguram o barco em equilíbrio no estaleiro. Colocaram-se as armadouras no modelo para manter o alinhamento das balizas e consolidar a ossada, pelo exterior, para começar a desempolar o interior do barco. É interessante verificar que ao mesmo tempo que seguram as balizas, as armadouras permitem também identificar desvios milimétricos da ossada que não se conseguem detectar com um simples controlo à vista desarmada.

O modelo foi separado da sua base inicial de construção e poderá agora ser desempolado no interior. Há muito que fazer e esta tarefa é particularmente fastidiosa já que, tendo em conta as dimensões da peça, não é fácil trabalhar com precisão no interior da embarcação. Para complicar o processo, em certas porções do cavername temos balizas com uma espessura igual ou superior a 20 mm que deverão baixar até ao máximo de 10 mm para garantir o realismo da estrutura. Estes barcos tinham balizas com secções bastante reduzidas de forma a garantir o baixo peso do barco em boas condições de velocidade.
Perspectiva do “ventre” do barco, em vários ângulos. Saliente-se a elegância de formas internas, numa embarcação pensado para o trabalho e o canal central pronto para receber a sobrequilha.
A sobrequilha e as escoas laterais operam como elementos de reforço longitudinal da estrutura.
Os vaus têm uma flecha bastante acentuada para compensar um tosado de convés pouco pronunciado.
Curvas de abertona de estibordo. As curvas de abertona são reforços de madeira colocados horizontalmente contra os vaus e contra a amurada. Colocam-se sobre o dormente entre dois vaus contíguos. Servem para contrariar a tendência que o casco tem para ceder aos esforços laterais exercidos pelos mastros sobre a estrutura. Situam-se geralmente na zona dos mastros, mas há navios nos quais estes são colocados ao longo de toda a embarcação. Neste caso, quatro curvas de abertona em cada bordo reforçam estruturalmente a construção. No tempo da grande marinha à vela, os navios podiam também ser dotados de curvas do convés e de curvas do revés As curvas do convés são reforços colocados na vertical sobre o convés e contra as amuradas. As curvas do revés são colocadas, também na vertical, mas sobre o tecto dos pavimentos e contra as amuradas. Destinam-se a suportar os esforços a que estavam sujeitas as cobertas quando tinham que transportar cargas pesadas e a artilharia, coisa que não sucedia com a nossa pequena canoa da picada.
Uma peça do trincanil ou trincaniz, em forma de pente para abraçar as aposturas. Importa dizer que ainda hoje nos barcos do Tejo, tal como sucedia no século XVI, se usa a designação de trincanil, sempre no singular, para designar a peça acima ilustrada; na nomenclatura naval, em termos mais latos, usa-se sempre a expressão trincaniz (versão moderna de “trinquanis”, o antigo plural de trincanil e que acabou por se impor quer no singular “trincaniz” quer no plural “trincanizes”). O trincaniz pode ser de maior espessura do que o forro ou ter espessura idêntica, sendo esta a opção seguida na canoa.
Perspectiva de estibordo e alçada a bombordo sobre a canoa da picada. Um esqueleto singelo de formas leves e airosas, fruto de um longo trabalho de modelação que está agora pronto para ser revestido.